Nigéria: Os atentados que o mundo finge desconhecer

NigériaInsuportável silêncio

Nem todas as mortes nos comovem por igual. O mundo indignou-se com os atentados terroristas de Paris e esqueceu-se dos milhares de mortos na Nigéria, vítimas do mesmo fanatismo religioso, do mesmo terrorismo, da mesma barbárie.

Dia 3 de Janeiro. Mohamed Bukar nunca mais vai esquecer este dia. Estava em Maiduguri, uma cidade nigeriana junto da fronteira com os Camarões. Era cedo, o céu estava ainda escurecido quando se começaram a ouvir as primeiras explosões, as rajadas de metralhadoras. Todos compreendessem que a cidade estava a ser atacada pelos Islamitas do Boko Haram. Mohamed nem pensou duas vezes. Meteu toda a família no carro e fugiu. O que viu ficou-lhe gravado na memória. “Vi corpos nas ruas. Crianças, mulheres, alguns a gritar por socorro.”

Abubakar Gulama não tinha carro. Fugiu a pé. Correu cerca de 40 Km até Monguno. “Toda a cidade estava em chamas”, explicou dias depois. “Havia corpos no chão, em todo o lado.” Hoje, o que viu persegue-o. Como conseguir esquecer tamanha tragédia?

Situação Crítica

O bispo de Maiduguri, D. Dashe Doeme, é um homem inconfurmado. Quatro dias depois deste massacre, onde terão morrido mais de duas mil pessoas, o mundo ficou em choque pelo atentado terrorista contra o Charlie Hedbo. O mundo chorou doze pessoas abatidas a sangue frio por um comando terrorista ligado à Al Qaeda. Porém, o mesmo mundo ficou em silêncio perante mais de duas mil pessoas assassinadas numa operação terrorista numa cidade nigeriana. Diz o bispo: “metade das pessoas já fugiu de suas casas. A situação é crítica. O mundo ocidental tem de fazer alguma coisa.” O mundo ocidental ficou em silêncio. Só no ano passado terão morrido mais de dez mil pessoas vítimas de Boko Haram. Na Nigéria, este grupo terrorista tem proclamado a “libertação” das regiões que controla, ameaçando com incursões militares em países da região. Agora, ninguém se sente seguro.

14 de abril de 2014. Mais de 200 raparigas são raptadas numa escola em Chibok, no nordeste da Nigéria. Dias depois, o líder do Boko Haram afirma tê-las raptado e que ia “vende-las no mercado”. O destino destas jovens estava traçado: raptadas, escravizadas, iam ser vendidas como mera mercadoria. O mundo depressa esqueceu os rostos destas raparigas e deixou de se comover com a sua sorte.

Muitos dos que morreram agora, no massacre de Maiduguri, muitos dos que foram forçados a fugir, são Cristãos. A Nigéria é um País muito longínquo. D. Dashe Doeme, pede-nos as nossas orações e que façamos alguma coisa pelo seu povo, pela sua diocese. “Caramba. Vivemos uma enorme ameaça. O futuro da Igreja está em risco. Em certas zonas já não há cristãos.” Será que o mundo não se comove com a tragédia do povo Nigeriano? Até onde iria a indignação do mundo se no ataque contra o jornal Charlie Hedbo tivessem morrido duas mil pessoas?

Fonte: Paulo Aido |www.fundacao-ais.pt