A expulsão das Ordens Religiosas na pena de um frade poeta

(2.ª Parte)
Adeus casa mil vezes bendita
Para os louvores de Deus destinada
Agora ficas profanada,
Gemendo triste e afflicta:
Os ceus e a terra tudo grita,
Lamentando o vosso mal;
Desgraçado Portugal!
Que tanto falavas de França,
De lá te veio a herança,
Agora estás outro que tal.

O Paulo eremita sancto!
Os vossos filhos muito mal amados
D’aqui os mandam desterrados,
Não sei quem tem poder tanto:
Eu faço o meu pranto.
As nossas lagrymas imaginae
Lembrai-vos que sois o pae
D’estes filhos desgraçados.
Pondo em nós vosso cuidados
A vossa bênção nos deitae:

Adeus Pae de penitencia,
Exemplo de sanctidade,
Só uma grande impiedade
Veiu fazer nossa ausência:
Mas sofrer com paciência
E a nossa obrigação;
Ahi fica Sancto Antão,
Nosso fiel companheiro,
Pois (...) mosteiro
Sempre foi nossa tenção.
“Decimas que fez um frade do
convento da Serra d’Ossa na
ocasião que foi expulso:

Adeus convento, e adeus serra
D’aqui nos mandam sahir;
Mas é preciso advertir
Que quem manda também erra:
E mais vil que o pó da terra
Quem aflige a humanidade,
E custoso na verdadade
Soffrer tanta tyrannia;
Quem faz uma tal avaria
Deus tenha delle piedade.

Adeus, ó restos mortaes,
Que jazeis nas sepulturas,
As vossas penitencias duras
Nos lembram cada vez mais:
Vós outros ahi ficaes,
Ah! dos homens esquecidos;
Nós já vamos convencidos
Por uma razão natural.
Que não sabemos porque mal
Somos tão affligidos.

Adeus meu habito sagrado,
Meu constante companheiro.
Antes eu morresse primeiro
Do que verte abandonado.
Se te deixo sou obrigado
Até com pena de morte,
A poder de força e lei forte
Conquistas nações inteiras;
Mas quem pisou nossas bandeiras
Em si mesmo deu mortal golpe.”

Diác. Hugo Guerreiro, in a defesa (21 de Fevereiro - 2018)